Esse é um post mensagem e o destinatário entenderá! Não sei falar sem sinédoque. Isso não significa que concorde completamente com o texto, porque no ápice da confusão e desgaste gerado numa conversa devido a uma simples sinédoque utilizada, nunca troquei um amigo pela sinédoque, ao contrário do autor do texto.
"Já faz um tempinho um jornalista que se dizia meu amigo veio torrar minha paciência com a seguinte frase: “não vale generalizar”. Ora, quando eu escuto alguém dizer isso, sei que o que vem adiante é estupidez.Em certa medida escrever é generalizar. No caso específico do texto jornalístico (e também no texto literário), a generalização que comumente usamos é uma figura de linguagem autorizada pela gramática. Chama-se sinédoque. Todos nós podemos escrever o que escrevemos por causa da sinédoque. Sem ela, ficaríamos horas diante do teclado e não sairia nada – nadinha.
A sinédoque é a figura de linguagem que nos permite dizer coisas do tipo “o jogador brasileiro é habilidoso” ou “as mulheres são muito falantes” ou “os franceses são enjoados” e assim por diante. Em nenhum dos casos o leitor inteligente deverá, diante de alguém que escreve de modo inteligente, fazer a objeção “ah, nem todo francês é enjoado, isso é preconceito”. O mesmo vale para os outros exemplos. Ninguém deve dizer “ah, nem todo jogador brasileiro de futebol é habilidoso, hoje em dia a habilidade está com os italianos”. É outra bobagem. A sinédoque dá completa liberdade para que as características mais amplas sejam utilizadas em associação a um termo que, sem a figura de linguagem, não mereceria a característica imputada. Essa figura de linguagem é das mais importantes. Por uma razão simples: tente escrever sem ela. Tente e verá como é difícil, talvez impossível.
A sinédoque é o que alguns desinformados tomam por “generalização”, e então pensam poder acusar quem está “generalizando” de ato impróprio. Ora, não podemos escrever frases do tipo "os são-paulinos são barulhentos, mas o Huguinho, o Zezinho e o Luisinho, e mais o fulano X e o Y, não são". Não faria qualquer sentido um texto assim. Ou seja, quando escrevemos optamos quase que naturalmente pelo uso de vários tipos de sinédoque. Falamos sem medo de quem alguém acredite que se está falando do Huguinho ou do Zezinho etc., torcedores do São Paulo, que “os são paulinos são barulhentos”. O leitor inteligente sabe disso. O leitor inculto não. O leitor inculto e, pior, mentalmente limitado inventa de criticar e solta a frase imbecil: “não vale generalizar”. Isso ferve o meu sangue.
Faz algum tempo, o tal jornalista que se dizia meu amigo quis ficar bravo comigo exatamente por causa do que achou que era a tal generalização. Eu disse uma frase desse tipo, “o Partido X é elitista”. Pronto! Do cume da sua má formação, o jornalista inventou de dizer “filosofar é generalizar?”. Quis dar de bonzão. Quis imputar a mim uma raciocínio errado quando, na verdade, era uma sinédoque clara, para poder conversar. Estava feita a desgraça. Eu podia deixar passar. Mas a irritação do cotidiano e a constante falta de modéstia da figura carimbada não me deram chance, e eu rebati. Disse ao jornalista que ele não era a sumidade intelectual que ele queria fazer crer. Em nome da sinédoque, perdi o amigo. Todavia, será mesmo que era amigo?
Claro que a vaidade do tal amigo urso era grande demais para ele admitir que não sabia sinedocar. E então arrebentou em palavrões – aquela coisa do cara que é pego de calça arriada.
Moral da história. A sinédoque garante que possamos continuar escrevendo para todos e tendo mais amigos. Um amigo escolarizado que não conhece a sinédoque pode causar só complicações. Opte pela sinédoque."
Paulo Ghiraldelli Jr, “O filósofo da cidade de São Paulo”.